Vai haver casório

Vai haver casório. O Tózé com a Odete, que, apesar dos dois filhotes de ambos, já marmanjões e a frequentarem a primária, há-de-ir vestida de branco, com um decote generoso e grinalda de flores a condizer. Vivem juntos há quase sete anos - ou será dez? - mas nada impede a Odete de concretizar o seu sonho de casar pela Igreja, com esta toda enfeitada de gerberas cor-de-salmão entrelaçadas em rosas brancas em botão. Descobriu num qualquer sítio da internet que às gerberas estavam associadas qualidades como beleza da vida, pureza, inocência, alegria e simplicidade. Ora a Odete, amiga da farra e da boa vida, acha que estas são qualidades que lhe assentam como uma luva, sim, porque apesar de boazona sempre se considerou uma mulher de virtudes a emanar simplicidade.

Os pais de ambos, bons católicos, conservadores, torceram o nariz a esta ideia dos ainda namorados e nunca digeriram a decisão de começarem a viver juntos e a ter filhos sem estarem casados. Este "pôr o carro à frente dos bois" nunca os conformou, mas já convencidos de que estes são tempos modernos em que já nada é como era, têm procurado não se ralar com a situação, mas que nunca gostaram, lá isso não. Além disso, pelo menos os pais da Odete, à sua decisão esclareceram-na desde o princípio que podia fazer o que quisesse da sua vida mas que não os incomodasse com nada nem lhes trouxesse netos para aturar e alimentar. Quem casa quer casa e cada arrume a sua e cuide dos seus. Era só o que faltava andar agora com esta idade a aturar e a educar os filhos dos outros. Os pais do Tózé, também não lhe deram grande ausio e lá tiveram que se desenrascar.

Posto isto, vai haver casamento e em nada há-de ser diferente dos demais: Um dia de sol, igreja enfeitada, grupo coral com violinos e solista para o "Avé Maria" de Schubert, os filhotes com a cestinha das alianças, ramo branquinho e sofisticado, reportagem profissional com fotografia e vídeo e almoço e jantar na badalada e fresca Quinta dos Carvalhos Velhos, com serviço e ementa à grande e à francesa, incluindo um grupo que há-de assegurar a música ambiente e  o bailarico lá mais para a noitinha. A ementa será algo sofisticada com entradas gourmet, cascata de chocolate,  decorações com fruta, tábua de queijos, miscelência de enchidos servidos em carro-de-bois, corta-sabores, peixinhos elegantes em caminha de molho de néctar de manjericão, com cobertura gratinada e enfeitada de ervas aromáticas, e carnes da melhor criação. Os doces e frutas hão-de ser à fartazana e não faltarão, para regar, os melhores vinhos, espumantes, aperitivos e digestivos.
O custo por cabeça há-de ser do caraças e uma vez que os paizinhos não foram na cantiga de suportar a conta, a Odete convenceu o Tózé, que é um querido, que a receita dos convidados há-de cobrir a despesa e ainda sobrar para uma semana de lua-de-mel alguras nas Caraíbas ou na pior das hipóteses, nas Canárias. Convém é que haja leite de coco a ser bebido do próprio, à sombra da palmeira e com o mar azul e calmo no horizonte a encher os olhos.
A decisão está tomada e bem tomada e, segundo a Odete, que nestas coisas tratou de convencer o Tózé, acha que nos dias que correm é uma decisão que não deve ser mal encarada e que só revela maturidade e serve para selar solenemente uma experiência de vida a dois. Casar deve ser depois de uma boa experimentadela e não no início de uma relação que pode ou não dar certo para além da primeira noite.
A Odete, há-de ficar linda no seu vestido branco e as ex-amigas hão-de roer-se todas de inveja quando publicar as fotografias da praxe no Facebook.